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Não havia porquê... (Parte I)

Akira:       Olá.

Amigo:       Oi

Akira:       Tudo bem com você?

Amigo:       Sim, sim. E com você?

Akira:       Tudo bem também! Que procura aqui no chat?

Amigo:       Nada de mais. Entrei apenas para conversar de bobeira... Quem sabe, com alguma sorte, fazer novos amigos.

Akira:       Amigos... Sei!

Amigo:       Sério! Num tenho maiores pretensões aqui, não. Na verdade, estou muito entediado aqui em casa, entrei pra distrair a cabeça... Admito que só entro aqui ainda pois um dos meus melhores amigos proveio deste lugar, mas sei que é extremamente difícil de fazer novas amizades. As pessoas procuram só sexo.

Akira:       Verdade, aqui a galera só quer saber de transar e mais nada.

Amigo:       Mas fazer o que, né!? A sala é disso! Mas enfim... Fale de você...

[...]

A maioria das conversas em bate papo se iniciavam do mesmo jeito. Normalmente, neste ponto, ou em algum momento – frase – pouco anterior, a coisa já estava praticamente toda decidida. Que coisa? O tipo de contato. Saber o interesse da pessoa, saber se era somente mais um que se julgava puro e íntegro o suficiente para se manter distante do que considerava perversão. Mas, afinal, o que não é pervertido neste mundo? Nunca julguei, ou pelo menos queria assim acreditar, pessoas que entravam na internet procurando sexo. É prático, fácil e direto. Claro que a pessoa deve saber o que está fazendo, deve saber selecionar para ter o melhor do que pode tirar de uma ida ao bate-papo. Conversar para saber se o parceiro te satisfaria na cama nos quesitos que te importam, sejam estes o tamanho do pacote ou o tipo de conversa que você terá.
Mas a história aqui não é sobre sexo, nem sobre como arrumar um parceiro... É sobre amizade e paixão.

A conversa iniciou-se como todas as demais, e nada de diferente havia até então. Estava cansado de ter repetido as mesmas frases tantas vezes no mesmo dia. O apelido parecia ser mais alguém totalmente desinteressante, talvez com alguns gostos iguais aos meus, mas nada em destaque. Conversa vai, conversa vem, vi a sua foto e confirmei meu desinteresse. Admito que nunca procuro por nada no chat, e que as vezes fico pensando que não adianta a foto que a pessoa me mostre, sempre vou achar ruim. Se a foto mostrar alguém feio (nem precisa me atrair, mas esteticamente feio) vou pensar que a pessoa vai dar encima de mim, ou vou pensar coisa pior, usar do discurso fútil criado por uma cabeça perturbada de  que “se posso selecionar as pessoas com quem tenho contato, por que não selecionar pessoas, também, de um nível de beleza mínimo?”. Se a foto mostrar alguém bonito e/ou gostoso vou achar (e provavelmente confirmar) que a pessoa não tem papo, que sua conversa é chata e que ela está me julgando por não ser suficientemente bonito para conversar com ele. Fico a imaginar que a pessoa não está interessada e, por isso, não deseja gastar tempo conversando comigo uma vez que pode ter alguém que desperte uma vontade maior. Contudo também penso que a foto pode ser bem tirada, a depender do ângulo e das características da foto. No final me satisfaço, normalmente, com pessoas “bonitinhas”, ou seja, pessoas que estão no meio.

Sim, sei que estes pensamentos são terríveis se a gente for analisar bem e, ainda, contraditórios devido ao que procuro. Podem imaginar que o que falo que procuro é puro cinismo, mentira ou vergonha de admitir que sou tão humano quanto as demais pessoas, mas digo claramente que não! Estou certo do que procuro: pessoas legais, para ter contato, fazer amizades. O problema, pessoas legais, interessantes, descontraídas, simples, compreensivas e inteligentes são, também, quesitos que descrevem os meus interesses afetivos. Num geral estou sempre dividido sexualmente e afetivamente. Mas expor meus pensamentos e meus critérios de seleção assim, de forma direta, não irá ajudar muito. Preciso falar um pouco de mim. Não no sentido de falar para alguém saber, mas para eu mesmo me sentir confortável e aliviado, falando as palavras, mentalmente, de forma lenta e progressiva para dar continuidade a escrita.

Se fosse necessário me definir, de maneira livre, posso dizer que sou alguém carente. Muito carente. Sinto constantemente falta de alguém na minha vida, e esse alguém não tem nada a ver com sentir falta de um companheiro sexual, um namorado, nada disso. Sinto falta de alguém. De uma pessoa que possa contar tudo que quero, que possa me sentir bem quando estiver perto, que me chame para sair, que ligue só para conversar coisas aleatórias, que me mande uma mensagem só para falar uma piada, que se convide para vir a minha casa para me fazer uma visita. Enfim, minha carência por alguém é no sentido mais simples possível. Passei grande parte da minha infância e adolescência sem ter amigos, apenas colegas os quais tinha pouco contato. Minha criação nunca foi voltada para o lado social. Sempre fui retraído, mas desesperado para poder me mostrar extrovertido e ver as pessoas gostando disso. Sempre quis que as pessoas me quisessem, mas demorou muito para isso acontecer.

Sentir-se sozinho é comum, mas é terrivelmente incômodo se sentir assim tendo a necessidade clara de se sentir justamente o oposto.  Já quis ser popular, sim, mas antes disso eu queria apenas ter alguém que pudesse chamar de melhor amigo. Demorou mas encontrei duas pessoas maravilhosas para tal. Infelizmente a gente, malditos seres humanos, criamos novas necessidades quando as velhas são resolvidas. Passei a querer pessoas para chamar de amigos. Tenho alguns, mas não da forma como queria. Sei que não devemos desejar pessoas do nosso jeito, mas eu estava cansado de ver as pessoas fazendo coisas que pareciam tão normais, tendo hábitos que todo mundo nem percebe que é importante, e eu sempre me sentindo distante disso. Via a vida de todo mundo se desenrolar e eu apenas sempre me sentindo sozinho, e isso não era uma crise de adolescência, pois eu não era mais um adolescente.

Odeio falar isso, dessa maneira, expor as coisas que vivi parece tanto um suplício para que alguém veja que eu “sofri”. Fico até pensando que as pessoas veem isso e ficam imaginando “Mas que bobagem, todo mundo sente isso. Ele está apenas se fazendo de coitado!”, mas gostaria de informar que estou ciente que cada um carrega uma cruz e que cada um é capaz de aguentar a cruz que lhe foi dado, mas a minha pesa e só eu sei o quanto que isso pesa. As pessoas, às vezes, deveriam gastar mais seus esforços mentais com pensamentos positivos no lugar dessa batalha de julgamentos. No final acho que quando se fala, ou pensa, isso um pensamento está por trás. Quem sabe as pessoas não querem dizer “Veja o quanto estou bem com os meus problemas. Eu resolvo meus problemas e não estou choramingando, sou forte e maduro o suficiente para superar tudo isso”. No fim, acho que todo mundo sabe que a vida é difícil, mas alguns apenas querem lidar com tudo em silêncio, outros “matando a cobra e mostrando o pau” e outros simplesmente não sabem lidar. Algumas vezes eu me encontro muito no time de quem não sabe lidar.

Sei que nunca soube lidar com a forma com que minha vida se desenvolveu. Queria passar por determinadas experiências, tentar algumas coisas, conhecer e ter contato com algumas pessoas e isso tudo nunca saiu do plano do querer. Sei que vejo que muitas vezes foi falta de esforço, e outras vezes esforço de mais. Tem hora que acho que sou do tipo que não se combina. Meus desejos não combinam com minhas atitudes. Também azarado, pois nunca achei quem me fizesse mudar isso de uma forma direta. Mas quem sabe só mal agradecido, pois acho que apenas não soube aproveitar o que me foi dado. De qualquer modo também não estou satisfeito com o jeito com que lido com minha vida.

Era dessa maneira que estava naquele dia. Já havia passado por uns acessos de raiva e tristeza alguns dias atrás, e naquele dia até admito que estava mais sereno. Apesar de insatisfeito com tudo achava que talvez as coisas apenas fossem melhorar, mas ainda estava mal comigo mesmo, me sentindo incapaz de valorizar e de aproveitar as oportunidades que haviam aparecido até então, e me sentindo, junto com tudo isso, um grande imbecil por ser intelectualmente incapaz de raciocinar da maneira que desejava. Queria resolver esse conflito interno, voltar aos clichês da autoestima e me sentir bem comigo mesmo novamente, mas era incapaz.

Eram sete horas da noite e estava atrasado. Estava no ônibus e pensando no porquê diabos estava indo neste encontro. A pessoa num era lá diferente ou necessariamente interessante pela internet. Passava na minha cabeça que já havia visto muito disso, já havia passado por muitas situações assim e agora, depois da faculdade, nunca pensei que faria isso de novo. “Conhecer gente de internet? Jamais!” pensava comigo diversas vezes. Mas lá estava.

- Jeff, cara, tu ainda num chegou? Acho melhor a gente remarcar. – Falou ao telefone, o que me irritou bastante, pois já estava chegando ao local marcado. Faltando apenas vencer alguns metros de caminhada.
- Não! De maneira alguma. Voltei pra casa e só estou aqui no centro da cidade por sua conta. Aguente mais um pouco que estou chegando em 5 minutos. Ninguém mandou chegar mais cedo também. – Falei agitado.

Chegado ao prédio de destino era só adentra-lo e descer dois lances de escadas para resolver isso. Não queria muito ter que fazer isso, mas já estava lá. Por um breve momento passou pela minha cabeça não fazer isso, ir embora. Talvez se tivesse um amigo meu ali perto nem teria continuado. Ligaria para ele e faria outra coisa para não jogar fora meu esforço em me arrumar e pegar o ônibus. Não havia este amigo. Apenas desci o primeiro lance, e antes de descer o segundo parei. Perguntei-me o que estava fazendo, voltando para a mesma rotina que tive anos atrás de conhecer pessoas que provavelmente não compartilhavam das mesmas intenções que eu compartilhava.  Sei que é quase impossível passar meu desejo em ter apenas amigos, mas tente imaginar que até para mim sempre foi difícil diferenciar um possível amigo de um possível amante.

Ainda não queria descer, ter que forçar uma conversa, me esquivar de situações chatas, enfim. Nunca me achei o tipo bonitão que alguém quer, mas também sabia que sempre pode haver alguém mais feio que eu que me queira. Sim!, sou um filho da puta, imbecil e fútil. O que fazer, sou eu. Não queria, mas sou eu.

Desci, procurei pelo café, mas não o via. Decidi ligar para ver quem atenderia ao telefone, uma estratégia simples, mas prática. Liguei. Reconheci rapidamente a pessoa que atendeu ao telefone, mas, talvez por estar sem meus óculos, não estava vendo sentido nisso. A pessoa era bem diferente da foto, parecia mais velha e era definitivamente mais arrumada e bonita. Vi que realmente o caso era específico: se a foto não mostra uma pessoa interessante e é por falta de fotogenia. Me aproximei.

- Olá. – disse da forma mais simples que pude. Ainda processava a pessoa que conversava pela internet e a pessoa que via.

- Oi, Jeff, tudo bem? – Cumprimentou-me.  Admito que primeiro fiquei feliz ao ver que ele era realmente bonito, mas meu senso crítico se ativou fortemente. Akira não era nada parecido com a foto, e até pela câmera, que um dia ligou, havia diferenças. Mas era mera aparência, e comecei a tentar descrever essa aparência. No fim tudo era meio desproporcional. Tenho um bom senso estético, não um ótimo, mas um bom, e fui observando cuidadosamente. Não era lindo de morrer, era bonito, mas esse bonito estava me incomodando. Eu não conseguiria passar para alguém sua beleza, pois as formas com que o descrevia com palavras mentais não correspondiam ao que eu via. Se falava subjetivamente a pessoa criada não tinha nada a ver com ele. Por que o achava bonito, então?

A conversa foi acontecendo, simplesmente rolando. E procurava entender o que estava me atraindo fisicamente. O conjunto completo apenas funcionava. Talvez uma sensação áurea, ou uma coisa cósmica? Bem, cosmos, num geral, não era o caso. Fiquei pensando sobre isso enquanto conversava. Havia algo ali de diferente de outras pessoas, mas semelhantes com lembranças que nem conseguia definir. Tentei relacionar com determinadas pessoas, mas não consegui achar uma resposta clara. Por fim eu estava preso em sua conversa. O papo estava absolutamente agradável, natural, e eu estava me sentindo bem por um motivo que nem eu conseguia entender. Senti-me estranho, pois enquanto ocupava parte do meu cérebro na busca por uma resposta a minha atração por ele, a outra se entregou por completo a situação e estava perdido na conversa, viciado e em êxtase.

Decidimos andar um pouco. Fomos para minha escola. Era noite de início de semestre e o diretório acadêmico estava aberto com pouca gente. Jogamos totó (pebolim/futebol de mesa) e tivemos um bom momento lá. A situação era engraçada, pois havia me atraído por ele, e como disse, isso era bastante sensato de acontecer tendo em vista que minha carência tange todos os lados, mas eu me sentia bem como não havia me sentindo por bastante tempo. Sentia como se estivesse me divertindo com meus melhores amigos. A coisa era boa, nossos gostos comuns, e a gente estava se dando muito bem. Estranhamente bem para contatos de internet.

Akira disse que precisava ir embora, pois era quinta e amanhã, sexta, acordaria cedo. Fomos embora, e enquanto caminhávamos pela cidade conversamos bastante. Ele disse que não era assumido, que tinha receito da família descobrir sobre ele. Contou sobre seu pai ter morrido há um ano, sobre como teve que assumir a responsabilidade da família por completo desde então. Também contou que era uma pessoa que se julgava carente, e estava perdendo as esperanças em achar algum cara legal que o desse carinho, que o tratasse bem e que fosse possível criar um relacionamento comum, com as mesmas obrigações e gozos. Achei estranho suas palavras pois não conseguia imaginar uma pessoa bonita, bem sucedida profissionalmente e simpática achar isso. Onde você acha as pessoas para se relacionar? Tem que ser muito burro para te tratar tão indiferentemente! Fiquei com essas coisas na cabeça.

Por fim, nos despedimos, e voltei para casa, pensando nele, em como deveria ser sua vida, para tentar entender o que passava em sua cabeça, e me sentindo estranho. Eu estava atraído por ele, mas acima disso eu havia me sentido tão bem com sua companhia. Cheguei em casa, e quando deitei fiquei pensando no encontro. Pensei tanto, e na dúvida que havia na minha cabeça naquele momento, que cheguei a conclusão que ele realmente não era de tirar o fôlego, mas ele havia coisas pontuais que me atraiam. Não era a pessoa que era linda para todos, mas ele era lindo para mim. Sua boca, principalmente, me tirava o fôlego. Eram exatamente os detalhes que me atraiam, as minúcias.

Continua...

Comentários

  1. Djey, tá perfeito! Continue deixando a alma falar, você pode criar uma obra prima :)

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